Novos comportamentos, a mesma fé

A declaração do papa emérito, Bento XVI, no último dia 8 de fevereiro de 2022, não me surpreendeu e sequer me causou escândalo. Acusado de ter acobertado casos de pedofilia envolvendo padre da Igreja Católica, ele pediu perdão pelos “erros cometidos” e pelos “abusos” do Clero. Não é a primeira vez que isto acontece com um pontífice e nem será a última. E vejo isso como positivo, pois mostra a face de uma instituição que sobrevive há quase dois milênios: santa, pois o perdão é uma clara manifestação do Divino; e pecadora, posto que é humana e às vezes humana demais.

É de longa data a discussão, dentro do seio da Igreja Católica, se ela deva se abrir ou não. Esse pêndulo entre a tradição e a modernidade tem marcado o ritmo de sua história institucional, bom para uns e desagradável para outros. Em geral, os mais conservadores se apegam a preceitos e, como no tempo de Jesus, alguns deles (não todos) me fazem lembrar os fariseus, por exemplo.

Outros, os mais modernos, alguns também, sustentam um flerte perigoso entre a permissividade e a desobediência. Aos mais afeitos à mudança, penso e sempre vi como positivo, a bússola comportamental inspirada pelo Espírito Santo. E nesse sentido, a Igreja, a meu ver, sempre acertou, como a obra de São Francisco de Assis, o Concílio Vaticano II, o Movimento Focolare e a gestão do papa Francisco como um todo. Este último capaz de dialogar com a contemporaneidade sem tirar o pé da tradição. É o equilíbrio necessário em todas as coisas, inclusive em matéria de fé.

Queiram os conservadores ou não, a Igreja muda sim. Não ao sabor e à pressa dos modernos. Mas, ela vai dando vasão às demandas do mundo e de seu tempo, no afã de manter o legado do Cristo e de manter-se enquanto instituição. E nesse movimento de lá prá cá, daqui prá lá, há ainda quem queira que as Missas voltem a ser celebradas em Latim; quem ache que Olavo de Carvalho foi um grande expoente do Catolicismo (pasmem!), e há quem ache que padre tem que se casar, mulher ser sacerdotisa, e uma infinidade de prós e contra, dependendo do lugar que ocupam. Particularmente, tenho ido para onde o Espírito Santo me sopra.

Pois bem. Quando eu era menino, ia todos os domingos à tarde para a chamada “Missa das Crianças”. Ficava ansioso pelo momento da paz, para cumprimentar quem estivesse ao lado, com um aperto de mão ou mesmo um abraço. E olhe que eu sempre fui retraído e tímido. E se esse abraço da paz fosse com a paquerinha de plantão, tinha um sabor todo especial.

Com o surgimento das primeiras levas de doenças transmitidas pelo ar, pelo aperto de mão que leva ao nariz ou boca, enfim, pela ascendência das doenças virais nos últimos anos, acabaram os cumprimentos, até não existir mais esse momento na Missa, salvo quando o padre reza a Oração pela Paz, antes do Cordeiro de Deus. E nesse ritmo, também a forma de dar a Comunhão mudou consideravelmente. Cá para nós, nunca gostei dessa coisa de depositar a Hóstia na boca.

Com a pandemia de COVID-19, a Igreja Católica se reinventou novamente. Acabou a Comunhão nas duas espécies (pão e vinho). Abraço da paz, nem em pensamento. Quem sabe uma troca de “soquinhos” e olhe lá. Dirigir-se ao Sacerdote ou ao Ministro, com máscara e a uma distância de pelos menos um metro e meio da outra pessoa. A Hóstia, obrigatoriamente na mão.

Mais um detalhe em especial chamou muito a minha atenção no último domingo. Verifiquei uma nova “economia de comunhão”, uma nova forma de dizer ao outro “eu amo você por Cristo, se cuide!”. A comunhão do álcool em gel ou em líquido. E ocorre exatamente naquele momento que era reservado ao abraço da paz. Uma corrente de solidariedade se forma, naturalmente, cada um procurando higienizar suas mãos e as do vizinho.

Na boa, gente, entre conservadores e modernos, é exatamente isso que importa e que o Cristianismo nos ensina de há muito tempo, verificado nessa “comunhão da saúde”: amar ao próximo, como a ti mesmo. O resto? Ah, o resto é firula teológica ou “pavãonisse” eclesiástica.

Autor

Claudefranklin Monteiro Santos

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