Recém-ativada, Celse já planeja ampliação em conglomerado
As Centrais Elétricas de Sergipe S.A. , a Celse, como é chamada, está no município de Barra dos Coqueiros, Grande Aracaju, onde opera com a conversão de Gás Natural Liquefeito (GNL) em energia elétrica. A transformação é feita no terminal de regaseificação da Usina Termelétrica Porto Sergipe I, a maior da América Latina. Num processo de tecnologia de ponta, a UTE Sergipe distribui energia para quase todo o país, quando acionada pelo Operador Nacional de Sistema (ONS). Com as operações praticamente recém-iniciadas (ela começou a operar em junho do ano passado), a Celse já fala em ampliação do conglomerado interno para 2022. A notícia é excelente para o estado, em razão de desenvolvimento e emprego. O Correio de Sergipe (CS) conversou com o Glauco Campos, Diretor Presidente da empresa, a respeito dos planos da companhia para Sergipe. Acompanhe:
Por Wilma Anjos
Correio de Sergipe: De que forma a instalação da UTE [Usina Termelétrica] Porto de Sergipe I, na Barra dos Coqueiros, contribuiu para o desenvolvimento de Sergipe?
Glauco Campos: Com fontes de receita para o estado, com geração de novos empregos e, via conexãodo terminal com o meio de transporte de gás, novos negócios possíveis a partir daqui. Durante a obra, foram 8 mil empregos diretos e indiretos. A Celse consegue trazer gás de qualquer lugar do mundo para injetar na malha de transporte, via Sergipe. Isso coloca o estado, junto com Rio, Bahia e Ceará, como terminal conectável à malha de transportes de gás.
CS: Por falar nisso, Sergipe é um dos cinco terminais aquaviários do Brasil que recebem gás natural no estado líquido para regaseificação. Como isso funciona?
GC: Eu vou dar uma explicação do nosso caso específico, que vale para qualquer outro, com alguma adaptação. Quando o ONS [Operador Nacional do Sistema] despacha a usina, ou seja, chama a usina para gerar, a gente faz uma solicitação de gás para o nosso fornecedor, que é lá do Catar. Ele está produzindo gás no estado gasoso e para ele chegar aqui, ele é transformado em estado líquido. A temperatura é baixada a menos 162 graus Celsius. Quando ele está líquido, você consegue transportá-lo numa razão de 600 vezes menos volume do que se ele estivesse gasoso. Daí você consegue fazer esse transporte intercontinental. Quando ele chega, tem uma operação chamda ship-to-ship. Ele chega e encosta no nosso terminal e fica ali pareado lado a lado. Daí são conectados uma série de dutos para transportar esse gás na forma líoquida [GNL], do navio para o nosso terminal. As funções principais do nosso terminal são receber o GNL [Gás Natural Liquefeito], armazená-lo e quando a Usina precisar, regaseifica e manda para a terra. É um terminal que daria seis quilômetros da costa. São oito quilômetros de gasoduto, seis marítimos e dois internos. A função do terminal é receber, armazenar e regaseificar esse GNL, transformando-o da forma líquida para a gasosa. A partir daí a geração de energia se dá na UTE e ela vai via linha de transmissão para todos os consumidores do Brasil. Sejam eles industriais, residenciais, comerciais, enfim. Desde que estejam conectados à rede de transmissão.
CS: Falar em ampliação da Celse já para este ano é precipitado, visto que as operações da Termelétrica praticamente iniciaram ?
GC: A ampliação do Parque Termelétrico depende de realização de leilão do Governo Federal e da vitória nesse leilão. A Celse não participou [dos últimos] e por isso não sagrou-se vencedora. Então não tem ação hoje de Termelétrica em construção. O que tem hoje é a negociação desse contrato de conexão com a TAG [Transportadora Associada de Gás], para conectar o terminal da Celse à malha de gasoduto. A gente espera que essa obra tenha início em 2022. Isto seria uma ampliação não no Parque Termelétrico, mas no conglomerado, construindo esse gasoduto que ligará o terminal até a malha de transporte.
CS: O modal usado nesse transporte são os caminhões, devido à pouca malha de gasoduto?
GC: Não. Isso é uma confusão que se faz. Originalmente havia um projeto de tirar o GNL do navio e distribui-lo via caminhão, a partir de Sergipe. Só que por uma série de razões técnicas de terminal, e até mesmo mercadológicas, esse projeto não evoluiu. Mas isso ficou na mentalidade [das pessoas], principalmente aqui em Sergipe, essa ideia de que o transporte de GNL é via caminhões. Não é essa a ideia. O que a gente entrega no final é energia elétrica. O gás, hoje, chega no máximo até a UTE, onde é utilizado para a geração de energia. Quando a gente concluir a conexão com a TAG, esse gás será transportado sempre via duto até a TAG, e da TAG vai funcionar como se fosse um novo sistema de linha de transmissão. Daí ele, em tese, pode ir para qualquer consumidor conectado à malha de gasoduto.
CS: São apenas 242 km de malha de gasoduto em Sergipe, não é verdade? A Celse teria interesse também em partir para essa frente de negócio, isto é, suprir a infraestrutura com investimentos privados?
GC: É verdade. Mas eu acho que, sem entrar no mérito da questão política, a Celse não tem planos de investir em malha de gasoduto. Ela tem essa intenção de conectar o terminal à malha, mas não tem planos de investir em distribuição de gás. Não é o nosso caso. Uma empresa mais específica teria mais propriedade para falar. Os nossos negócios diferem.
CS: Com 1,5 GW de potência, a UTE Porto de Sergipe I é capaz de atender 15% da demanda de energia do Nordeste. Em que momento essa oferta se concretiza e para quais estados seria?
GC: A UTE, assim como várias outras semelhantes, é uma usina por disponibilidade. Existem dois tipos de receita: a receita fixa mensal que visa remunerar o investimento daquela unidade para ela ficar disponível para o sistema, para todo e qualquer momento que ele desejar que ela gere energia. E quando ela gera energia, ela recebe uma receita variável. Essa deliberação em gerar ou não energia não é nossa, é do Operador Nacional do Sistema, o ONS, que determina semana a semana quais usinas gerarão energia no Brasil. A UTE está aqui 100% disponível, ao longo do programa, que é de 25 anos, aguardando um despacho do ONS. Essa decisão é centralizada, que não nos cabe. Quando a gente é chamado a gerar essa energia, fisicamente você não tem como precisar para onde ela vai exatamente. Ela entra no sistema de transporte de energia elétrica da agência de transmissão e vai para algum destino que você não controla. Isso fisicamente. Mas contratualmente, a Celse tem contrato com 26 distribuidoras de energia do país. A Celse tem contrato, por exemplo, com a concessionária do estado do Amazonas , com o estado do Rio de Janeiro, Sergipe, Bahia. Ou seja, contratualmente, a gente atende quase que o Brasil todo. São 26 contratos distruídos no Brasil como um todo. Esse número de 15% para o Nordeste é apenas para dar uma dimensão de quanto a usina está gerando. Não quer dizer que a ela fica aqui no Nordeste ou foi contratada por servidor do Nordeste.
CS: Mas esses 15% são pelo menos para os nove estados nordestinos?
GC: Na verdade mais que isso, mas, de certa forma, sim, fica com os nove estados.
CS: Além do terminal de GNL, Sergipe tem potencial para exploração de gás natural em campos offshore, isto é, no mar. Qual o olhar da Celse para esta prospecção?
GC: O interesse é com o potencial fornecimento de gás para esses novos projetos que a Celse tem. A Celse hoje tem potencial de ampliação de novas usinas , tem o seu terminal que, quandofizesse essa conexão com a TAG, poderia trazer gás da malha para utilizar nesses novos projetos. Então, havendo essa nova produção em Sergipe trazido para a terra, a Celse tem interesse em avaliar um projeto de fornecimento para esses novos projetos de expansão interna. É dessa forma que a gente se relaciona com esse negócio. Não temos interesse em atuar diretamente na exploração de gás. Nem em campo onshore [em terra], nem em campo offshore.
CS: Foi amplamente noticiado ano passado que a manutenções nas turbinas da UTE Sergipe comprometeu a capacidade produtiva da usina. O que aconteceu que gerou a paralisação?
GC: Aí são dois assuntos diferentes que coincidiram e criou uma certa confusão. Teve um reboliço na mídia em meados de abril, maio, junho do ano passado, que foi quando começou a ficar evidente que a gente estava entrando numa severa crise hídrica e a mídia percebeu que a maior usina do Brasil, que é a UTE Sergipe, não estava operando. E ali teve uma mídia negativa neste sentido, muito voltada, podemos dizer, contra o Operador do Sistema Elétrico Nacional e menos à Celse Sergipe. Mas a Celse foi citada como exemplo de uma não operação ótima do sistema. Só que tem uma peculiaridade no caso da Celse, que se repete em algumas usinas, que é o seguinte: como esse gás sai lá do Catar, demora em média quatro a seis semanas para chegar aqui. É uma questão bem técnica. O tipo de despacho da UTE Sergipe é diferente de outras usinas. Tem usina que o despacha é na sexta e ela começa a operar no sábado, ou seja, no dia seguinte. No nosso caso, o nível da operação se dá 60 dias depois do despacho. Quando estávamos entre abril e maio de 2021, havia essa reclamação na imprensa de que a maior usina do Brasil estava parada, enquanto vivíamos uma crise hídrica. Foi porque a decisão que o ONS tinha tomado de não despachar a usina havia sido tomada ainda num período úmido, entre janeiro e fevereiro, meses em que ainda não se tinha essa informação da crise hídrica. A mídia negativa foi nesse ponto, de que estamos no meio da crise e usinas a óleo operando, que é uma energia caríssima, enquanto a maior usina do Brasil estava parada. Ela estava parada porque não tinha sido chamada a despachar. Ela foi chamada e começou a operar no dia 10 de julho de 2021. Daí entramos na segunda parte da resposta. Na verdade não houve manutenção em turbinas. As turbinas sempre operaram muito bem desde o início, estão 100% disponíveis. O que a gente teve foi um problema em transformador, que impedia a turbina de funcionar. A gente ficou de 3 de julho até 27 de novembro com uma das 4 turbinas que a usina tem, em manutenção, aguardando o retorno desse transformador para operar a plena carga. Nesse período operamos com dois terços da capacidade total.
CS: Pelo que entendi, toda essa coincidência, aliada a informações equivocadas na imprensa geraram esse mal entendido.
GC: Sim, são muitos detalhes. Quando você pega uma usina do tipo da UTE Sergipe, que é uma usina de despacho antecipado de 60 dias, isso não é comum até para quem é do setor elétrico. Quando surge esse problema de crise hídrica e a imprensa vem em cima, é muito específico. Não era algo fácil de informar. Eram muitas especificidades. No Brasil você só tem 3 usinas nessa modalidade de despacho antecipado. Ou seja, é uma modalidade muito específica. De um total de milhares de usinas, você tem 3 que faz esse despacho específico. Apesar de termos ficado com o motor fora durantes três ou quatro meses, o nível de energia que tínhamos disponível e entregamos com uma regularidade foi impressionante. Esperávamos muito mais dificuldade.