O que são armas termobáricas, supostamente utilizadas na guerra da Ucrânia?
Conforme o número de civis mortos dispara na guerra na Ucrânia, aumentam as acusações de que a Rússia estaria utilizando armamentos proibidos ou que resultariam em crimes contra a humanidade. Armas termobáricas e de fragmentação podem levar a mortes em massa de civis se utilizadas em espaços urbanos. Os russos, porém, negam o uso.
No fim de fevereiro, durante uma entrevista a repórteres após uma reunião com o Congresso dos Estados Unidos, a embaixadora da Ucrânia no país, Oksana Markarova, disse que a Rússia usou uma arma termobárica, conhecida como bomba a vácuo, em sua invasão em 24 de fevereiro. “Eles usaram a bomba a vácuo. A devastação que a Rússia está tentando infligir à Ucrânia é grande”, disse aos legisladores.
Não houve confirmação oficial de que armas termobáricas tenham sido usadas no conflito na Ucrânia. Porém, equipes de jornalistas da rede americana CNN disseram ter avistado um lançador de foguetes termobárico russo perto da fronteira ucraniana nos dias seguintes à invasão.
No dia 3 de março, o Reino Unido afirmou que a Rússia havia implantado armas termobáricas na Ucrânia. “Até onde Putin irá, quais armas ele autorizará para atingir seu objetivo final, é desconhecido, mas vimos o uso de grandes quantidades de artilharia. Vimos a implantação de sistemas de armas de artilharia termobárica e nos preocupamos como amplos podem ir”, disse o secretário de Defesa britânico, Ben Wallace.
Armas que ‘sugam o ar’
As armas termobáricas são projetadas para criar forte calor e pressão capaz de sufocar. Os mísseis, que são lançados de tanques, normalmente consistem em um recipiente cheio de combustível e explodem em dois estágios: primeiro, os mísseis distribuem um aerossol que consiste em minúsculos componentes de combustível e metal. Então, uma segunda carga inflama a nuvem de aerossol, produzindo calor e pressão extremos e queimando o oxigênio na área.
As ondas de choque duram mais do que as dos explosivos convencionais. São chamadas de armas de vácuo por causa da sensação de que sugam o ar dos pulmões das pessoas.
Não é exatamente assim que essas armas funcionam, dizem especialistas. Elas são mais parecidas com explosões de gás ou poeira do que com um vácuo, de acordo com um relatório do Armament Research Services, e a intensa pressão que elas liberam causa trauma nos pulmões.
As armas termobáricas são mais precisas do que as bombas convencionais mais poderosas, disse Dan Wasserbly, chefe de notícias da Janes, uma agência de inteligência de defesa de código aberto.
Mas as armas a vácuo ficaram famosas porque “você não pode se esconder” delas, acrescentou, já que o aerossol que elas liberam pode se infiltrar em estruturas fechadas. É por isso que elas são frequentemente usadas para atingir posições militares em túneis, fortificações, bunkers e cavernas. Mas em áreas urbanas altamente populosas, eles facilmente acabam matando civis.
“Digamos que você tenha pessoas escondidas, talvez civis, em um porão”, disse Wasserbly. “Isso não os protege contra algo assim, porque os aerossóis entram no porão e pegam fogo e todo mundo tem uma morte horrível.”
Armas termobáricas não são proibidas. Mas elas representam um grande risco para civis quando implantados em ambientes urbanos, e um ataque pode constituir um crime de guerra por vários motivos, inclusive se os civis forem os alvos ou se o agressor não tomar medidas para minimizar os danos.
As armas termobáricas já foram usadas pelos Estados Unidos no Iraque e no Afeganistão.
O suposto uso de armas a vácuo, e também as proibidas munições clusters, na Ucrânia levantou temores de que o conflito esteja entrando em um estágio mais mortal, principalmente se a Rússia usar amplamente as armas nas cidades ucranianas.
“Não existem bombas boas – todas são más notícias. A razão pela qual essas bombas atraem tantas críticas é a natureza indiscriminada de como eles funcionam”, disse Wasserbly. “Como estamos falando de guerra urbana aqui, o potencial de danos colaterais e baixas civis é muito alto.”
A secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, disse ter visto relatos, mas não tinha confirmação, de que a Rússia havia usado tais armas. “Se isso fosse verdade, seria potencialmente um crime de guerra”, disse ela em uma coletiva de imprensa, observando que existem organizações internacionais que avaliariam.
Armas proibidas
Além das armas termobáricas, a Rússia também é acusada de utilizar outro armamento letal para civis, porém este com proibição em diversos países: as armas de fragmentação, ou cluster.
As munições cluster não são armas de precisão. O foguete, bomba ou projétil que as lança gira enquanto voa, espalhando pequenas bombas, que atingem uma ampla área indiscriminadamente.
As armas são notórias por produzirem bombas que não explodem imediatamente, mas podem explodir se forem perturbadas mesmo muito tempo depois de lançadas, tornando-as perigosas para civis, incluindo crianças.
A Human Rights Watch informou que um míssil balístico russo carregando uma munição de fragmentação atingiu um hospital em Vuhledar, uma cidade na parte de Donetsk controlada por Kiev, no leste da Ucrânia, em 24 de fevereiro. O ataque matou quatro civis, feriu mais 10 e danificou a infra-estrutura de saúde, disse a organização.
Parte do que parecia ser um foguete Smerch – outra arma do arsenal russo que pode transportar munições cluster – caiu em um playground em Kharkiv, de acordo com um vídeo verificado pelo jornal americano Washington Post e examinado por especialistas. Não ficou claro se o foguete carregava uma única ogiva ou munições cluster.
Um tratado internacional que proíbe armas de fragmentação, a Convenção sobre Munições Cluster, foi adotado em Dublin em 2008 e entrou em vigor em 2010. O tratado proíbe qualquer uso, produção, armazenamento ou transferência de munições cluster e obriga os países a destruir quaisquer munições cluster em seus arsenais e comprometer-se a limpar a terra contaminada.
Mais de 100 países fazem parte do tratado, incluindo mais de 20 estados membros da Otan. Rússia e Ucrânia – que possuem armas de fragmentação – não aderiram. Os EUA também não fazem parte do tratado e justificam alegando a possibilidade de utilizar a arma contra a Coreia do Norte em um possível ataque à Coreia do Sul./AP, REUTERS e W.POST
Fonte: Jornal O Estado de São Paulo