Ministério da Justiça atropelou normas internas para barrar filme de Gentili
O Ministério da Justiça atropelou normas internas da própria pasta e adotou uma interpretação difusa do Código de Defesa do Consumidor para tentar barrar a exibição do filme “Como se tornar o pior aluno da escola”, do comediante Danilo Gentili (foto).
Segundo apurou O Antagonista junto aos técnicos do Ministério da Justiça, o processo de sanção às distribuidoras da película deveria ter sido iniciado pela Secretaria Nacional de Justiça, não pela Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor (Senacon).
Como mostramos, a Senacon é hoje comandada pelo advogado Rodrigo Roca, um dos defensores do senador Flávio Bolsonaro (PL) no caso das rachadinhas.
Pelo trâmite usual da pasta, antes de aplicar uma multa por desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor, o Ministério da Justiça deveria ter determinado a reclassificação da película via Secretaria Nacional de Justiça. A reclassificação do filme de fato ocorreu, mas apenas hoje. Um dia depois de ter sido alvo de uma sanção administrativa.
No despacho que tentou suspender a exibição do filme e impor uma multa de R$ 50 mil ao grupo Globo, à Netflix e à Amazon por eventual descumprimento de medida administrativa, a Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor pede que, somente a partir daí, a Secretaria Nacional de Justiça seja oficiada a alterar a classificação indicativa do filme.
As distribuidoras receberam essa sanção administrativa com base no art. 56 do Código de Defesa do Consumidor por suposta prática abusiva ao “prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços”.
Especialistas ouvidos por O Antagonista afirmam que a sanção administrativa pode de fato ser aplicada, mas em situações emergenciais. O que não parece ser o caso do filme de Gentili.
O filme foi lançado em 2017 e recebeu classificação de produto destinado a maiores de 14 anos por ato publicado no Ministério da Justiça em setembro daquele ano. O período de análise durou um pouco mais de um mês. Houve um pedido de reclassificação na época, que foi rejeitado pela pasta.
Agora, diante da sanha dos bolsonaristas nas redes sociais, o Ministério da Justiça resolveu agir quase cinco anos após o lançamento do filme e três anos após a atual gestão. E um processo de reclassificação que dura em média 30 dias foi equacionado em menos de um.
“Sem entrar no mérito no (des)acerto da decisão proferida pela Senacon, e mesmo que não tenha violado os direitos ao contraditório e à ampla defesa, por ter sido proferida em caráter cautelar, a suspensão da disponibilidade do filme nas plataformas de streaming pode ser interpretada como ato de censura, pois há outros meios de se questionar e contornar a discussão abordada no filme que não a sua suspensão”, afirmou a O Antagonista o advogado Enrique Dorado.
O Antagonista