Golpistas se aproveitam de alta em transações online para buscar vítimas

Por Wilma Anjos

No período em que o país se recolheu à quarentena, as compras online, por muitas vezes, foram o método de não se expor ao Coronavírus. O problema foi que, junto aos novos usuários nas transações digitais, criminosos se passando por vendedores surfaram junto essa onda, deixando vítimas por todo o país. Um dos golpes relativamente recentes é o do “Falso Intermediário”, que consiste em duas pessoas, comprador e vendedor, serem enganadas por um terceiro, desconhecido de ambos. Esse estranho se apropria de um anúncio verdadeiro, faz a ponte entre as vítimas e consegue convencê-las de não trocarem informações entre si. O golpe é concluído quando o dinheiro do veículo é depositado na conta de um laranja. Proprietário e cliente ficam com o prejuízo e a partir daí inicia o trabalho da polícia. Um dos principais site de anúncios online do Brasil, o OLX, conversou com jornal Correio de Sergipe (CS) sobre o que vem apurando nesses anos do modus operandi dos bandidos. A diretora de Produto e Operações, Beatriz Soares, conversou com a nossa equipe sobre o assunto e elencou pontos que podem prevenir o crime. Confira:

Correio de Sergipe: A OLX é uma das empresas mais conhecidas em anúncios na internet. Há registros policiais de criminosos que se apropriam da credibilidade da marca para ludibriar as pessoas. Vocês têm notado um aumento no número de golpes, sobretudo na revenda de veículos?

Beatriz Soares: O que a gente notou no mercado digital, como um todo, foi que o período da pandemia trouxe bastante gente nova para o ambiente virtual. Foi um crescimento geral de golpes. O golpista saiu da rua para o online, e com novas pessoas entrando no mundo digital, os golpes no Brasil cresceram bastante.

 

CS: A pandemia da Covid-19 fez essa curva aumentar?

BS: Temos um estudo de mercado nosso, interno, quanto a outros players de mercado que mostram isso, principalmente no início de 2020, quando iniciou a quarentena no Brasil, entre abril e junho. Tanto nos golpes bancários, quanto em e-commerces houve uma explosão de incidência por conta disso: muita gente entrando pela primeira vez nesse mercado. Você sabe que é um mercado que é preciso conhecer para transitar, tanto financeiro, quanto de e-commerces. Os fraudadores acabaram se aproveitando e houve um boom de fraudes no Brasil.

 

CS: Em algum momento a OLX chegou a acionar a Justiça? A empresa foi onerada?

BS: Na verdade a OLX é um classificados como a gente tinha lá no passado, que você colocava o anúncio no jornal e as pessoas buscavam o que precisavam. Temos esse papel de colocar compradores e vendedores em contato, mas as transações não acontecem dentro da OLX. O que fazemos é o que vem crescendo muito no mercado, o que chamamos de engenharia social. As pessoas se encontram dentro da plataforma, mas acabam negociando fora, por isso não onera o nosso dia a dia, mas entendemos que há uma responsabilidade dentro do mercado digital. Essa educação que fazemos agora, para nós, é muito importante, por isso falamos tanto sobre dicas, explicamos um pouco como as pessoas podem se proteger e como essas coisas acontecem, porque independente se a gente tem uma participação, entendemos que o mercado precisa ser educado. Costumo dizer que sabemos o que fazer quando saímos, como nos protegermos, onde colocamos nosso celular, onde vai a nossa bolsa, mas no mercado digital, muitas vezes entendemos que estamos protegidos, porque tem esse distanciamento físico. Porém, assim como precisamos saber andar na rua, precisamos saber como nos proteger no online. Fazemos estudos e entendemos o modus operandi dos golpes, independente de onde aconteçam. Para nós é importante entender como eles navegam no mercado digital como um todo, independente da plataforma.

 

CS: Quantos anúncios circulam na plataforma?

BS: A OLX tem hoje, em média, mais de 7 milhões de usuários por dia. Em autos, somos a maior plataforma do Brasil. Temos 2 milhões de anúncios por mês, só de veículos.  A quantidade de pessoas e transações que estão acontecendo ao mesmo tempo é muito grande, e se comparado ao número de crimes, o percentual de problemas é pequeno.  Sabemos que tem quadrilhas que são especializadas em golpes online e para eles pouco importa a plataforma. Em relação aos autos, lançamos uma campanha ano passado com o iCarros e Mercado Livre. Entendemos que é um problema do mercado, e que todas as plataformas têm que se unir para combater, até porque os fraudadores se unem também. Este ano devemos repetir a iniciativa, que acontece em outubro, com o objetivo de conscientizar e educar as pessoas.

 

CS: O usuário tem como perceber que está falando com um estelionatário? Conseguiram identificar isso no estudo que fizeram?

BS: Temos uma equipe multidisciplinar e nela integra uma parte de tecnologia. Tentamos prevenir que criminosos estejam na plataforma. Damos ferramentas também ao usuário para se proteger. Digamos que você está vendendo ou comprando um carro na OLX. Recomendamos aos dois lados que façam uma verificação de perfil. O que é isso? Você passa informações para a OLX, tiramos uma foto sua e então eu consigo provar que você é quem diz ser. Verificamos o seu perfil a partir de seus documentos. Você passa a ser uma pessoa que a OLX verificou e isso dá mais segurança para as duas partes, porque você não entrega os seus documentos para outra pessoa que desconhece. A outra coisa que temos dentro da plataforma é o histórico veicular. Por exemplo, se você estiver vendendo um veículo, conseguimos verificar as informações através do Renavam [Registro Nacional de Veículos Automotores], se você tem alguma pendência, multa, se o carro já teve algum registro de roubo ou coisas do tipo. Disponibilizamos isso para o vendedor e comprador e o comprador pode procurar carros que tenham esse histórico veicular. Isso aumenta muito a sua segurança. Mas se você não tiver nenhuma dessas coisas e ainda assim estiver querendo transacionar, pedimos para tomar muito cuidado com a pressa. O fraudador normalmente tenta acelerar o processo para você não conseguir prestar muita atenção no que está acontecendo. Fica calmo. Se a pessoa estiver interessada no negócio, ele vai acontecer. Preste atenção nos detalhes que estão sendo dito e do que ele está pedindo para você como comprador ou vendedor fazer. Pedimos sempre para evitar que transacione com alguém que não seja o dono do veículo. A não ser que você esteja comprando numa loja, concessionária. Mas se você está fazendo as negociações com uma pessoa física, priorize falar com o dono. O golpe do intermediário passa por você não estar transacionando comprador com vendedor. Você tem um intermediário que não é o dono, por isso é recomendado tratar sempre com proprietário. Ah, mas o meu pai é o dono do carro! Então tenta entender como é essa identificação, como é que ele consegue provar que é de fato o pai. Acho que a última coisa para se proteger de golpes é sempre ficar dentro da plataforma, porque assim conseguimos rastrear. Hoje na OLX você pode denunciar qualquer comportamento suspeito. Temos uma equipe que cuida disso. Tratamos 90% dos casos em até duas horas. Se você fez uma denúncia, dá tempo da gente verificar o que está realmente acontecendo. Se você for para um aplicativo de mensagem, perderemos essa rastreabilidade, não vamos conseguir ajudar. Então, dá para saber quem é o estelionatário? É difícil, porque você vai ter que identificar. Mas se você entender que aquele comportamento é suspeito, se a pessoa está tentando te apressar, se ela não é dona do veículo e está tentando negociar com você, o que sempre orientamos é denunciar, porque temos uma equipe especializada para isso.

 

CS: A ferramenta de verificação de perfil é um mecanismo novo? Esses histórico do veículo que vocês conseguem levantar, é uma parceria com o Detran?

BS: Vai fazer dois anos agora em maio que lançamos a verificação de perfil.

 

CS: O lançamento foi em razão dos golpes que aconteciam na pandemia ou já era uma pretensão planejada?

BS: Temos a intenção de cada vez mais ser uma plataforma segura. Temos promovido isso para o mercado. Faz parte das nossas entregas previstas essa evolução de cadastro, conforme o mercado e também as tecnologias vão avançando. Há cinco anos era impensável você fazer este tipo de check para entrar numa plataforma. Hoje já é uma forma que o usuário entende e aceita, com um custo que não é repassado para ele. A verificação de perfil é gratuita, mas há um custo envolvido, porém não repassamos. Temos um time aqui de tecnologia só para cuidar da segurança da plataforma. Isso faz parte das entregas que fazemos. Começou primeiro localmente. A gente começou na Bahia e no Mato Grosso. Depois expandimos para o Brasil inteiro. Hoje esta funcionalidade está disponível para todo mundo que compra e vende autos  [automóveis]dentro do OLX. Não é para todos os usuários, mas entendemos que autos é um item mais sensível, pelo valor que ele tem, então disponibilizamos para todos usuários de compra e venda de automóveis. O histórico veicular a gente tem uma parceria, sim, com o fornecedor, que é um terceiro que tem contato com os Detrans do país. Esse é um serviço pago na OLX. Então você compra a verificação do seu automóvel e conseguimos dar um laudo que garante que aquele automóvel está em conformidade e expõe para o comprador tudo que tem naquele automóvel. O comprador não paga nada, quem paga é o vendedor.

 

CS: Mas segundo a assessoria de comunicação do Detran de Sergipe, os dados do veículo não são revelados a mais ninguém além do proprietário. Eles se equivocaram?

BS: De fato o proprietário dispõe das informações. Ele nos dá o número do Renavam, o número da placa do carro e consultamos. Fazemos a consulta pública, não há enriquecimento de dados. Trazemos essas informações para a pessoa. O que tentamos evitar é essa troca de informações entre comprador e vendedor. Tentamos evitar que você passe dados pessoais, porque dados hoje em dia são algo bastante sensíveis. Pedimos para que as pessoas não troquem dados, porque se você estiver falando com um estelionatário, provavelmente seus dados podem ser usados de maneira prejudicial a você. Nosso papel é assegurar que aquele veículo que você se interessou realmente tem aquelas informações. Isso é mais segurança para as duas partes.

 

CS: Até agora o que está claro é que para evitar golpes o ideal é não sair do ambiente da plataforma de negociação. Não migrar para nenhum aplicativo externo de bate-papo, por exemplo.

BS: E a gente vai orientando também. Sabemos, por exemplo, que os fraudadores tentam te levar para um aplicativo de mensagem. Quando ele pede seu telefone, a gente exibe uma dica de permanência no chat da OLX. Se a pessoa te pede um documento, a gente orienta a não fornecer. Dessa maneira conseguimos acompanhar a negociação e dar dicas específicas, conforme a conversa vão acontecendo. São dicas contextualizadas, porque você não tem a obrigação de saber o que pode ou não passar.

 

CS: O histórico dessa conversa fica salvo?

BS: Todos os chats da OLX são rastreáveis. A pessoa tem acesso ao próprio chat e temos uma frente de colaboração com as autoridades. Quando somos solicitados pela polícia, passamos as informações que temos dentro da plataforma.

 

CS: Como se dá essa colaboração exatamente? O que vocês confiam à polícia?

BS: Assim que a polícia oficia a empresa a respeito de um caso especifico de seu interesse, a gente colabora. Ajudamos a polícia a entender este tipo de golpe. Há pelo menos dois anos a gente tem feito isso: explicado o que conhecemos, porque muitas vezes isso é muito novo para a polícia também. Fazemos Webinar com os policiais e temos um site específico sobre todos os golpes eletrônicos que conhecemos. Passamos muita informação de como é esse modus operandi. Esse golpe do intermediário é complexo. Normalmente o que acontece é comprador e vendedor se acusarem mutuamente, até eles entenderem que existe um intermediário.

 

CS: Houve algum caso que surpreendeu vocês pela ousadia dos criminosos?

BS: Como os casos acontecem fora da plataforma,  tomamos conhecimento quase que ao mesmo tempo que o resto das pessoas, pelo noticiário. Eu acabo sendo tão espectadora quanto os outros. Mas, sim, os golpes têm crescido e a criatividade deles surpreende. Fico muito feliz que cada vez mais a imprensa leve este assunto a público, porque acho que temos um papel conjunto de educação e os estelionatários exploram muito esta falta de informação. Por isso é tão importante educar as pessoas.

CS: A Justiça já responsabilizou a OLX por estas transações?

BS: Não, porque elas acontecem fora da plataforma. Os criminosos fazem de tudo para retirar suas vítimas do site. Quando eles migram para um aplicativo de mensagens, encerra a participação da empresa neste processo. Por isso não há que se falar em responsabilidade da OLX, porque o crime ocorre fora do ambiente seguro da plataforma.

 

CS: Como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) ajuda na segurança do usuário?

BS: Eu não sou especialista nesse tema, mas vou dar uma noção geral de como acontece. Temos uma obrigação de resguardar os dados do usuário e, em caso de solicitação, apagar todas as informações que temos. Fazemos o que eles chamam de anonimizar os usuários. Eu não posso fazer nenhuma ação pensando em você, por exemplo. Tenho que fazer pensando num grupo de pessoas, sem ser direcionado individualmente. Não posso compartilhar seus dados sem a sua anuência. Você precisa consentir que aquela informação será trocada. É mais ou menos quando te ligavam oferecendo um produto e você não fazia ideia de como esta pessoa conseguiu seu número. Provavelmente você deixou em algum lugar, que passou para outra empresa. É isso que a Lei resguarda. Isso não pode acontecer. A qualquer momento você pode solicitar a um site que delete todas as suas informações pessoais. Antes isso não era possível. Particularmente eu acho que o grande ganho com a LGPD foi a importância dada aos dados colocados no mercado. As pessoas passaram a refletir melhor, porque havia a cultura de está tudo ok, eu posso deixar meus dados por aí. Não havia consciência dos riscos de fornecer e-mail, RG e CPF, por exemplo.

 

CS: Para encerrar, como eu peço para deletar meus dados fornecidos ao OLX, por exemplo?

BS: Na OLX, a opção está na aba ‘Minha Conta’, na gestão da sua própria conta. Ela tem que estar visível em todos os sites, não só na OLX. No passado você tinha que pedir solicitação à empresa, agora ficou mais fácil.