‘Covardia’, diz irmã de homem morto em São Gonçalo por sargento da Marinha

Dor e indignação são os sentimentos de Fabiana Teófilo, irmã de Durval Teófilo – morto na noite da quarta-feira (2), em São Gonçalo, por um sargento da Marinha quando chegava do trabalho.

Durval Teófilo Filho, de 38 anos, foi alvejado por tiros na porta do condomínio onde morava. O autor dos disparos foi o sargento da Marinha Aurélio Alves Bezerra, preso em flagrante. Ele alegou que confundiu Durval com um bandido.

“O que aconteceu foi uma covardia, porque meu irmão era trabalhador. Meu irmão nunca encostou em nada de ninguém. Ele sempre saiu de casa cedo. Minha mãe criou três filhos sozinha e nenhum seguiu vida errada. Ele era o único irmão que eu tinha e acontece um negócio desse? Ele tira a vida do meu irmão? Aí vai dizer que é legítima defesa? Não tem como. Meu irmão não tinha arma, meu irmão veio do serviço, ele veio do trabalho. Ele chegou em casa onze horas da noite”, disse Fabiana.

Vítima foi morar em condomínio para fugir da violência

O homem que foi morto pelo próprio vizinho, na porta de casa, deixou a comunidade do Capote, em São Gonçalo, há 12 anos, e comprou um apartamento na cidade em busca de mais segurança.

“Será que fosse um branco andando e mexendo na mochila, tinham atirado no meu irmão três vezes? E ele falando que ele era morador do condomínio? Será? Eu duvido. Eu duvido muito”, questiona Fabiana.

Durval trabalhou como letrista em uma plataforma da Petrobras e atualmente estava empregado como repositor de um supermercado.

A família esteve no Instituto Médico Legal de Tribobó na tarde desta quinta-feira (3) para fazer a liberação do corpo.

O laudo do IML diz que a causa da morte foi hemorragia interna causada por projétil de arma de fogo.

O corpo de Durval vai ser enterrado na sexta-feira (4) no Cemitério São Miguel, em São Gonçalo. Ele deixa a mulher e uma filha de 6 anos.

Homicídio culposo

O sargento da Marinha Aurélio Alves Bezerra foi indiciado por homicídio culposo — quando não há a intenção de matar.

A polícia entendeu que o militar não teve a intenção de matar porque confundiu a vítima com um bandido. Uma fiança de R$ 120 mil foi estipulada, mas até a última atualização desta reportagem não havia sido paga, e o sargento permanecia preso.

“Segundo declaração do autor, ele atirou na vítima em reação a uma suposta tentativa de assalto, enquanto a mesma caminhava e mexia em sua mochila. Ao constatar seu erro, o acusado prestou imediato socorro a Durval, levou para um hospital, mas ele não resistiu. De acordo com a DHNSG, o autor do crime foi indiciado por homicídio culposo e permanece preso”, diz a nota da Polícia Civil.

O indiciamento do sargento como homicídio culposo ainda pode mudar em até 30 dias — após a audiência de custódia ou se o delegado que assumir o caso entender que o crime deve ser enquadrado como homicídio doloso, quando há intenção de matar.

O RJ1 teve acesso às imagens de câmeras de segurança do condomínio em São Gonçalo onde o crime aconteceu.

Pelas imagens, Aurélio chega de carro ao portão do condomínio. Durval, a pé, surge também na direção do portão, a alguns metros do veículo do sargento. Ele parece mexer em uma bolsa, como se procurasse algo – possivelmente a chave do portão.

O primeiro disparo é feito pelo sargento de dentro do automóvel. Aurélio salta e dá mais dois tiros. Um deles atinge a barriga de Durval, que cai. O militar, então, se aproxima.

À PM, Aurélio disse que avistou um homem se aproximando de seu veículo “muito rápido”. Ainda segundo o depoimento, Durval chegou a dizer a Aurélio que era morador do mesmo condomínio.

O militar, então, socorreu o vizinho ferido, levando-o ao Hospital Estadual Alberto Torres, onde foi preso. Durval não resistiu e morreu na unidade.

Aos PMs, Aurélio informou também que “a localidade é perigosa e costuma ter muitos assaltos”.

‘Foi racismo’, diz viúva

Luziane Teófilo, mulher de Durval, disse que escutou os tiros. Ela afirma ainda que o marido morreu porque era preto.

“A minha filha, que tem 6 anos, estava esperando por ele. Imediatamente ela olhou pela janela e disse que era o pai dela”, narrou. Luziane foi levada ao hospital. “A médica me falou que ele tinha sido alvejado por um vizinho que o confundiu com um bandido. Isso me deixou transtornada. Eu nunca pensei que isso fosse acontecer com um vizinho nosso”, contou.

“Vendo as câmeras, ouvindo a fala do delegado e pelo que os vizinhos estão falando, tenho certeza de que isso aconteceu porque ele é preto. Mesmo eles falando que ele era morador do condomínio, o vizinho não quis saber. Para mim, foi racismo sim”, afirmou a viúva.

O que diz a Marinha

Em nota, a Marinha do Brasil diz que “tomou conhecimento da ocorrência envolvendo um dos seus militares, em São Gonçalo-RJ, e informa que está colaborando com os órgãos responsáveis para a elucidação do fato”.

“A MB lamenta o ocorrido e se solidariza com os familiares da vítima”, acrescenta o texto.

Fonte: G1RJ