Sobre sobrenomes

Nunca tive um amigo com o sobrenome de Leitão. Aliás, de menino até hoje, nunca conheci ninguém com aludido sobrenome, nem na escola primária, nem no ginásio, nem, mais tarde, já no Aracaju,  no curso clássico, e, muito menos, no de direito. No tribunal com jurisdição em seis Estados, só um, como parte. Nenhum apareceu como advogado, que eu me lembre. De Leitão, salvo engano de memória, o min. Leitão de Abreu, do Supremo, de tempos bem distantes,  ministro do Executivo Federal, também. Com dois não há como se fazer um remédio. 

Interessante é que a impressão imperante é de Leitão ser sobrenome de gente de valor,  homem de relógio, como diria papai. De outro lado, como se fosse o Diabo soprando no ouvido, a lembrança de que leitão é sinônimo de porco jovem. Daí que se há família carregando o sobrenome Porco no nome existir, não pode ser gente da alta, afinal  porco vive no lamaçal, a fuçar lama, além de se constituir de carne que muitos condenam. Como é, então, que Leitão pode ser sobrenome da alta nobreza, eu me pergunto, sem obter resposta. Teimosamente permaneço, sem abrir mão de achar que o sobrenome Leitão é reservado a membro da família real, ou a chanceler ou afim,   embora leitão não passe de um porco, esteticamente feio, focinho que não tem igual, despojado de qualquer elegância, estando bem distante de ares de nobreza, de gente branquela, do nariz arrebitado, que parece exibir na testa o carimbo de importância.   

Outros sobrenomes são impolutos. Ou, não são comuns.  Declino uns – Pamplona, Alcântara, Quintanilha, – que, só de pronunciados, já despertam atenção, como se fossem convidados da festa do rei anunciado pelo mordomo real na porta do salão de festa. O sobrenome pesa, mesmo formado apenas por letras. Daí muitos, ao casar, legar a esposa dois ou três sobrenomes, porque o importante é o primeiro, e, como não aclama a insignificância dos seguintes, vai o estoque todo. Às vezes, até, o próprio nome de parente famoso se torna sobrenome. O inusitado é quando o marido recebe o sobrenome da esposa, atitude que o Código Civil  permite. Conheço alguns que topariam, não fossem impedidos pela vergonha. Ai, então, a subserviência se esbugalharia. Não se revela devido, afinal quem muito se curva mostra os fundilhos.      

Autor

Vladimir Souza Carvalho

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