Nas pétalas das flores amarelas

Dia desses eu passava pela avenida Rio de Janeiro, a mesma onde nasci, cuja casa ficava perto da esquina com rua Guaporé (até hoje tenho vontade de conhecer este lugar que dá nome à rua onde brinquei bastante na minha primeira infância). Navegando dentro do carro, mesmo prestando atenção ao trânsito louco que ali se instaura em alguns horários (principalmente com muita gente andando abaixo dos 40km/h na faixa da esquerda, o que torra os nervos como amendoim no tacho), deparei-me com as florezinhas amarelas que ourificam (inventei) o canteiro onde estão os trilhos que serviam aos trens que tanto passaram por ali.

As flores e o mato verde dão um tom de brasilidade lindo que me remete ao início do Romantismo brasileiro e à geração de Gonçalves Dias com suas palmeiras e sabiás. Você pode até achar que estou romanticamente exagerado, mas Romantismo é saudosismo. As florezinhas amarelas me fizeram passar por um túnel do tempo que me causa uma explosão de sentimentos diferentes em relação à mesma pauta. Exemplo:

– Raiva, porque acabaram com o tráfego de trens, um transporte absolutamente necessário, mais barato e eficiente que qualquer outro terrestre. Por sorte do destino, está sendo retomado e novas linhas férreas já singram o Brasil.

– Tristeza, ninguém se lembra das centenas de milhares de histórias das pessoas que usufruíram das ferrovias para viagens e mudanças de vida. A antiga estação, por onde passaram os candangos (assim falava minha mãe) para a construção de Brasília. História viva que mataram no esquecimento. Parece que nós, sergipanos, gostamos de uma História morta.

– Saudade, minhas lembranças de menino que vêm na velocidade do trem passando e o barulho das pedras que eu jogava nos vagões pra ouvir os téins téins onomatopaicos. Escrevo isso com sorriso leve de canto de boca. Como é nostálgico! Todo mundo deveria ter instantes de nostalgia. Mas, ao que parece, as pessoas andam muito ocupadas aumentando o próprio vazio.

Foi de 2012 para 2013 que os trens findaram sua trajetória e a ferrovia começou a se deteriorar. Não é estranho que a linha começasse a se esvair justamente depois que os trens pararam? O que entendo é que as duas “criaturas” sobreviviam quando estavam juntas. O abandono das ferrovias dá uma demonstração clara do deixar-se ir de histórias e vivências ricas em sentimentos, amores, desencontros, despedidas entre lágrimas e sorrisos na estação corroída pelo abandono, localizada na Praça dos Expedicionários.

Para manter tudo isso vivo, lá estão nas pétalas das florezinhas amarelas, caladas, ao sabor do vento e de quem as enxerga na invisibilidade do tempo que ninguém tem.

Autor

André Brito

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