Estudo diz que Lua tem muito mais água

Por Roberta Jansen

Rio – Cientistas conseguiram reunir as mais consistentes provas da existência de água na Lua – e ela seria relativamente acessível. A descoberta “inequívoca” tem implicações importantes para futuras missões ao satélite e, posteriormente, a Marte. Os dois estudos foram publicados ontem na Nature Astronomy.

Investigações anteriores já tinham reportado a presença de água na Lua, sobretudo nas proximidades do polo sul lunar, em locais muito frios e escuros. No entanto, essas detecções tiveram como base observações que não são capazes de diferenciar a molécula de H2O propriamente dita de outros compostos de hidroxila (formados por oxigênio e hidrogênio) presentes em minerais. Outros estudos apontaram reservatórios subterrâneos inacessíveis

Desta vez, porém, novas pesquisas indicaram a potencial presença de água congelada em toda a superfície da Lua, inclusive nas áreas claras e mais quentes. Um dos trabalhos foi baseado em observações feitas no Observatório Estratosférico de Astronomia Infravermelha (Sofia, na sigla em inglês), da Nasa. Trata-se de um Boeing 747 adaptado para carregar um telescópio capaz de fazer análises em comprimento de onda que oferecem resultados mais específicos. Dessa forma, ele consegue detectar a “assinatura” específica de H2O que não é compartilhada por outros compostos de hidrogênio e oxigênio.

Casey Honniball e colegas da Nasa descobriram que a água está presente em altas latitudes ao sul, num volume que seria de 100 a 400 partes por milhão. “É muita coisa”, afirmou Mahesh Anand, professor de Ciência Planetária e Exploração da Universidade Aberta de Milton Keynes, em entrevista ao jornal britânico The Guardian. “É mais ou menos a mesma quantidade de água dissolvida na lava que jorra de vulcões submarinos na Terra e que poderia ser transformada em água líquida sob as devidas condições de temperatura e pressão.”

A presença de água tem implicações importantes para futuras missões lunares porque poderia ser tratada e usada para beber, por exemplo. Separando-se o hidrogênio do oxigênio, por sua vez, poderia ser possível obter combustível para foguetes. E o próprio oxigênio poderia ser usado para respirar. Essas condições tornariam bem mais fácil a instalação de uma base permanente na Lua, como planeja a Nasa, que também poderia servir de trampolim para Marte. “A água é uma commodity muito cara no espaço”, resumiu Anand.

Coletar essa água nas áreas de sombra da Lua, onde as temperaturas raramente estão acima dos 230 graus Celsius negativos, seria bastante complicado. “Mas se houver água nesta parte que não fica permanentemente nas sombras, que é potencialmente uma área bem grande, ela se torna mais acessível”, afirmou Ian Crawford, professor de Ciência Planetária e Astrobiologia da Birkbeck, universidade de Londres

Dúvidas

Algumas dúvidas persistem. Uma delas é sobre a forma em que essa água existe. Uma possibilidade é que ela esteja dissolvida no “vidro” lunar, criado quando meteoritos atingiram a superfície do satélite. Outra hipótese seria que essa água estaria distribuída no solo lunar na forma de pequeninos cristais de gelo. Nesse último caso, a extração se tornaria bem mais fácil.

Uma outra questão ainda em aberto seria a profundidade desses depósitos. Se eles estiverem restritos a camadas superiores do solo, na avaliação do professor Crawford a sua importância prática seria mínima, embora ainda levante questões interessantes sobre como ela teria chegado ali.

A única maneira de descobrir isso, segundo os especialistas, é ir para a Lua e começar a cavar. Como já existe uma nova missão tripulada para lá, programada para 2024, essa estratégia pode não estar muito distante. Cientistas britânicos também estão desenvolvendo um braço robótico capaz de recolher amostras do solo lunar de até um metro de profundidade, como parte de uma missão russa prevista para 2025.

Mas onde, exatamente, cavar? As áreas sob sombras ainda seriam a melhor aposta, uma vez que a água estaria mais protegida dos raios do Sol. O segundo estudo publicado na Nature Astronomy sugere que essas áreas mais promissoras podem ser mais numerosas e acessíveis do que se imaginava até agora.

Usando imagens da Lunar Reconnaissance Orbiter, Paul Hayne, da Universidade de Colorado em Boulder, e colegas conseguiram mapear a distribuição de pequenas crateras e calcular que aproximadamente 40 mil quilômetros quadrados da superfície lunar teriam capacidade de armazenar água.

No início deste mês, oito países assinaram uma série de acordos propostos pelo governo dos Estados Unidos tendo em vista uma futura exploração da Lua e de seus recursos naturais.