O feminino invade a arte de rua
Numa manhã de verão do ano passado, as ruas do Brooklyn, em Nova York, amanheceram repletas de lambe-lambes com o rosto de uma mulher de olhar desafiador e a frase “Stop Telling Women To Smile” (“parem de dizer para mulheres sorrirem”). Em poucas horas espalhou-se a notícia de que era uma iniciativa da artista de rua Tatyana Fazlalizadeh, uma americana de 28 anos filha de pai iraniano e mãe negra.
Em entrevista ao New York times, Tatyana explicou que conversou com mulheres de todos os cantos sobre o que no Brasil chamamos de cantada de rua antes de dar vida à obra. A intervenção urbana continuou com mais lambe-lambes, mais rostos femininos de olhar determinado e as frases “My Outfit Is Not an Invitation” (“minhas roupas não são um convite”) e “Women Do Not Owe You Their Time or Conversation” (“mulheres não devem a você nem o tempo delas, nem uma conversa”).
As imagens que compos nasceram de fotos que fez das mulheres com as quais falou e cujos rostos ela, depois, desenhou à lapis.
Tatyana quis explorar o tema porque abusos verbais cometidos contra mulheres nas ruas são difíceis de serem definidos e detectados, e raras vezes chegam a ser avaliados judicialmente. Durante a pesquisa, ela encontrou desde mulheres que se diziam oprimidas com um “e aí, gata?” até uma outra que levou um tiro porque se recusou a dar ao rapaz que a cantava seu telefone. “É assim que o corpo feminino é consumido e considerado propriedade pública para ser exibido e comentado”, disse Tatyana ao Times. “Mulheres precisam começar a falar sobre esses abusos porque são as pequenas coisas que têm impacto em circunstâncias maiores, como estupros, violência doméstica e abusos no trabalho.
O feminino na arte de rua ganha tanto espaço que recentemente o New York Times dedicou uma coluna inteira ao tema e lembrou que no Brooklyn também trabalha a australiana Vexta, que pinta imagens psicodélicas durante a madrugada em prédios abandonados.
Mas elas estão por toda a parte, e não apenas nos Estados Unidos.
Enquanto em Joanesburgo, África do Sul, a artista Faith 47 saía pela noite com uma escada e tintas, em Manhattan, Maya Hayuk pintava um famoso mural nas esquinas das ruas Bowery e Houston, no East Village.
“Essas mulheres estão tomando as ruas justamente por que as ruas são um lugar que as oprime e intimida”, escreveu Julia Baird para o Times.
No Afeganistão, Malina Suliman sai à noite com tinta e lanterna. No começo, enquanto grafitava, era atingida por pedras jogadas por quem passava e via uma mulher pintando paredes. Ainda assim, nunca deixou de criar. Mas depois de pintar a imagem de um esqueleto usando uma burca, o Taliban exigiu que ela parasse, e em sinal de ameaça, quebrou as pernas de seu pai. Bastaria para calar qualquer um, certo? Mas não Suliman. “Minha mensagem é a de que meninas de qualquer parte do mundo não tenham medo de sair às ruas e se expressar”, disse ao Times.